Está frio, e chove. Embrulho-me no meu puído manto de esperança e abrigo-me sob o guarda-chuva rasgado de um otimismo falso. Mas o vento cortante da tristeza insiste teimosamente em trazer-me as gotas grossas e geladas da solidão, enquanto a espessa neblina cinzenta da saudade, mal iluminada pelo solitário lampião das recordações, paira como uma mortalha sobre a rua escura e vazia que é minh'alma.
Incomoda, essa luz espectral, amarelenta e morta do velho lampião. Parece sólida, como se fosse tinta velha, pintando cada gota de chuva com cores doentias. Dói...
O tempo gruda-se em meus dedos, como uma massa amorfa, feita de momentos desconexos, o presente perdido nos passados. São momentos ocos e pesados, intermináveis como um soluço preso na garganta, eternos como a lágrima que teima em não rolar.
Vislumbro ao longe, no limiar da visão, um fantasma silencioso e meditativo. É teu vulto, talvez, perdido no infinito espaço vazio que existe entre duas camadas de eternidade.
Quero seguir-te. Quero alcançar-te. Mas não posso. E choro a minha renúncia em lágrimas ausentes e vazias. E percebo, enfim, que também eu sou um espectro extraviado, vagando num mundo que não é o meu.
Choro. E sobre mim continua chovendo esta tristeza... esta solidão...