terça-feira, 13 de julho de 2010

Ciclo de Vida

- Li A Ditadura dos Cartéis, de Kurt Rudolf Mirow, numa edição de 1978. O autor discorre sobre os esforços que certos segmentos industriais empreendiam, na época, para reduzir o tempo de vida útil de seus produtos, com o objetivo de forçar o aquecimento do consumo e assim maximizar os lucros.
- Dava como exemplo, entre outros, o caso das lâmpadas incandescentes, mostrando que os modelos mais antigos duravam dez vezes mais que os mais recentes e denunciava a existência de linhas de pesquisa destinadas a definir métodos de fabricação capazes de assegurar que o produto não sobrevivesse por muito tempo ao prazo de garantia.
- Bem, ele estava certíssimo. Atualmente, o conceito de ciclo de vida é aplicado extensivamente ao projeto de qualquer produto - até mesmo no ramo de serviços!
- Argumentam os empresários que essa abordagem garante os níveis de emprego e de modernização do setor. É verdade... mas garante mais ainda o faturamento das empresas e o aumento do lixo produzido pela comunidade...
- Há setores onde o ciclo de vida é justificável: são geralmente indústrias de alto nível tecnológico, como a aviação e a astronáutica, a informática e alguns aspectos da medicina. Mas mesmos nessas áreas há exceções: o velho DC-3 Dakota ainda tem exemplares voando na aviação civil (pelo que diz a Wikipedia), enquanto na militar o vovô B-52 Stratofortress ainda assiste impávido seus sucessores serem recolhidos aos museus. A Abreugrafia, invenção tupiniquim, continua salvando vidas pelo diagnóstico precoce de moléstias pulmonares e cardíacas.
- Se você rebuscar pela sua casa, com certeza vai encontrar aparelhos antigos que ainda funcionam: relógios, caixinhas de música, algum brinquedo... geralmente aparelhos mecânicos que independem de uma fonte de energia - é preciso dar corda neles. Termômetros e higrômetros também costumam resistir à passagem do tempo.
- O conceito de ciclo de vida veio para ficar; até o Magiclick (quem se lembra?) dava garantia de 104 anos apenas para o mecanismo interno que gerava a faísca. O estojo externo, após alguns meses de uso, deteriorava-se rapidamente (tenho um desses, todo remendado, que ainda funciona).
- Mas está faltando um detalhe no ciclo de vida para que esse conceito seja realmente válido: uma lei que defina claramente a responsabilidade pela destinação dos restos mortais dos nossos servos mecânicos. A legislação atual é esparsa, tímida, incompleta e muitas vezes ignorada. Iniciativas como a da empresa privada de reciclagem OXIL (lixo, ao contrário), deveriam ser incentivadas a expandir suas atividades por todas as metrópoles do Brasil (e do mundo). E é preciso que a responsabilidade do fabricante se traduza em ações diretas de reciclagem do seu produto.
- Atualmente, os cadáveres da indústria são, em sua maioria, abandonados sem qualquer cerimônia nos lixões; mesmo onde há coleta seletiva, os resultados são pífios. Os fabricantes deviam ser obrigados, pelo menos, a explicitar, no ciclo de vida de cada produto - todos eles - instruções detalhadas para o funeral dos mesmos, não apenas com vistas à defesa das comunidades, mas também da natureza. Afinal é ela que se encarregará de reciclar quase tudo, e ninguém quer que ela tenha uma indigestão...
- Mas que saudade do tempo em que as coisas eram feitas para durar!

4 comentários:

  1. Sí, es verdad amigo Rodolfo...

    para bien nuestro y del medio ambiente...
    Yo también siento noltalgia de ese tiempo...

    Saludos,

    Sergio

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  2. Pois é Barcellos, o primeiro tópico que você aborda é a chamada "obsolescência programada" expressão tão em moda nos anos setenta e que caiu em desuso (talvez até por desuso) nesta década, infelizmente. Infelizmente por que ao não se falar mais, acaba se esquecendo, daí ser providencial que se escreva sobre isso, como você o fez.
    Outra é questão de como se livrar dos rejeitos da nossa sociedade de consumo, e quem tem responsabilidade sobre isso. Parece que ainda não atingimos um estágio de consciência que nos "obrigue" a pensar na natureza como coisa séria e não apenas como objeto de algumas ONGs ecologicamente engajadas.
    Sou a favor que continuemos a "botar a boca no trambone" sempre que a oportunidade surja, até por que, quando o bicho pegar, estaremos tranquilos porque fizemos a nossa parte. Gostei do texto, parabéns e desculpe se não fui claro, é que o tema me é tão importante, que o trato com demasiada emoção, o que talvez influa na minha capacidade de raciocínio.

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  3. Barcellos, me alegra saber que você também leu A Ditadura dos Cartéis, o livro que acabou com o que me restava de inocência.
    A respeito de objetos que duram, tenho aqui diante de mim um pequeno objeto feito de plástico e metal muito brilhante: um mini-grampeador. Junto a ele ainda existe uma minúscula caixinha de papelão onde estavam os grampos originais (acabaram há alguns meses, mas guardei a caixinha por motivos sentimentais). Nem o aparelho nem os grampos nunca apresentaram o menor sinal de corrosão. Foram adquiridos por mim em março de 1967, no PX da Base Aérea de Albrook,Canal Zone (atualmente Panamá), por 35 cents! Encontrei há pouco numa papelaria grampos que servem perfeitamente nele. 43 anos de bons serviços!

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  4. Sobre objetos antigos tenho algo a dizer. Coleciono relógios de pulso com ênfase nos mecânicos antigos, dos quais tenho umas seis dezenas dos anos quarenta e cinquenta. Claro que os mantenho em ordem, mando fazer manutenção preventiva sempre e reparos quando necessários. Agora mesmo estou usando um "Gruen", francês dos anos 50 que trabalha quase sem alteração apesar da idade.

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