quinta-feira, 10 de junho de 2010

Ao Mestre

- Quatrocentos e trinta anos atrás, Camões cerrava definitivamente o único olho que a guerra lhe deixara, abandonando o mundo corriqueiro dos homens mortais para ingressar no Elíseo luminoso dos vates eternos. Sua vida conturbada de boêmio aventureiro, por vezes fugitivo da justiça, terminara.
- Em 1556, regressando de Goa, - onde fora responder a inqúerito - naufraga na foz do Mekong. Consegue salvar o manuscrito dos Lusíadas, mas sua amante-escrava chinesa Dinamene perece nas ondas revoltas. Nasce daí um dos mais belos sonetos do Mestre:

Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.

- Camões também curtia as redondilhas, principalmente quando glosava os motes (ou motos) que os amigos lhe propunham em desafio. E volta e meia versejava em espanhol:

MOTE
Ojos, herido me habéis,
acabad ya de matarme;
mas, muerto, volve á mirarme,
por que me resucitéis.

GLOSA
Pues me distes tal herida,
con gana de darme muerte,
el morir me es dulce suerte,
pues con morir me dais vida.


Ojos, ¿qué os detenéis?
Acabad ya de matarme;
mas muerto volved á mirarme,
por que me resucitéis.


La llaga cierto ya es mía,
aunque, ojos, vos no queráis;
mas si la muerte me dais,
el morir me es alegría.


Y así digo que acabéis,
ojos, ya de matarme;
mas muerto, volved á mirarme,
por que me resucitéis.

- Fica aqui minha homenagem ao grande vate.

3 comentários:

  1. Assim como Camões, por ter vivido em dias que Portugal era uma potência marítima e ter escrito "Os Lusíadas" foi conhecido como o Vate dos Mares, quero ser o primeiro a proclamar que Barcellos é o Vate dos Ares. Ainda que não tenha, que eu saiba, escrito o poema épico da aviação, por seu passado aviatório, o epíteto passa a valer a partir de agora, e aguardaremos seus versos "aéreos" para algum dia, quem sabe.

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  2. Meus respeitos ao mestre Camões, pela data da sua pasagem para a eternidade.
    Mas, eu lembrei que também sei versos em espanhol, e falam de eternidade:

    Tanto tiempo disfrutamos de este amor
    Nuestras almas se acercaron tanto asi
    Que yo guardo tu sabor pero tu llevas tambien
    Sabor a mi.

    Sin negaras mi presencia en tu vivir
    Bastaria con abrazarte y conversar.
    Tanta vida yo te di que por fuerza tienes ya
    Sabor a mi.

    No pretendo ser tu dueno.
    No soy nada, yo no tengo vanidad.
    De mi vida, doy lo bueno
    Soy tan pobre que otra cosa puedo dar?

    Pasaran mas de mil anos, muchos mas.
    Yo no se si tenga amor la eternidad.
    Pero alla tal como aqui, en la boca llevaras
    Sabor a mi.

    Que tal?

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  3. Por favor, corrija: pasagem=> passagem!
    Gracias!

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