terça-feira, 19 de abril de 2011

Páscoa

      Há quem zombe das Escrituras, há aqueles que lhes são indiferentes, há os que creem na verdade literal delas e há os que acham que elas devem ser interpretadas como uma coleção de mitos, lendas, alegorias ou registros imprecisos.
     Essa é a minha leitura do episódio narrado no Êxodo, relativo à origem da Páscoa. Não pretendo impô-la a ninguém.
    A Páscoa judaica (Pessach) ocorre em 14 de Nissan, 163 dias antes do início do ano judaico. Foi instituída na época de Moisés, em comemoração à libertação do povo de Israel, escravizado no Egito. Pessach quer dizer passagem, e alude à passagem da escravidão à liberdade, depois que a arrogância do Faraó (que se autoproclamava deus do Egito) levou-o a desafiar dez vezes o próprio D'us (adoto aqui esta grafia em respeito aos que a usam).
     Apesar dos avisos que lhe foram seguidamente dados por Moisés e das pragas que sucessivamente se abateram sobre o povo, o Faraó persistiu em sua atitude, o que culminou na morte dos primogênitos egípcios, incluindo o herdeiro do próprio Faraó. Só então este concordou - com relutância - em libertar os hebreus.
     Agradeço à minha amiga Regina Rozenbaum, a quem submeti a versão original desse texto, o ter-me chamado a atenção para o fato de que as "explicações" que ligam o "Pessach" à passagem de um anjo exterminador, embora condizentes com os textos bíblicos, dão margem a uma interpretação equivocada, como se a responsabilidade pelo triste acontecimento devesse ser imputada a um povo escravizado e não à impiedade de seus escravizadores.
     Não admira que o 14 de Nissan marque tão profundamente o povo judeu. A passagem de um povo inteiro da servidão à liberdade marca, verdadeiramente, o nascimento de Israel como nação - não apenas como simples povo. E mesmo tendo sofrido invasões, ocupações, expropriações, perseguições, diásporas e o maior genocídio já perpretado na história, Israel permaneceu coesa desde então, ostentando entre suas bandeiras o louvor à liberdade e o repúdio à escravidão.
     Já a Páscoa cristã marca a ressurreição de Cristo. Segundo os Evangelhos, esta teria ocorrido no domingo logo após a festa do "Pessach", daí a confusão entre as duas festas.
     Como o calendário judaico é lunissolar, ou seja, parcialmente baseado nas fases da lua, essa data varia de ano para ano. É uma festa móvel, que serve como base para outras datas, como a da quarta-feira de cinzas (que leva a reboque o carnaval).
     Em 325, o Concílio de Nicéia estabeleceu normas para a festividade, mas subsistiram dúvidas quanto ao cálculo da data. Naquela época de intolerância religiosa "oficial", muitos queriam evitar que as celebrações cristãs coincidissem com as judaicas.
     Quando Gregório XIII corrigiu o calendário, no século XVI, publicou no Decreto "Inter Gravissimas" normas para o cálculo da data: seria o primeiro domingo depois da lua cheia que ocorre em ou logo após o equinócio de primavera no hemisfério norte (20 ou 21 de março). A data da lua cheia é a definida nas Tabelas Eclesiásticas, que, sem serem matematicamente precisas, fornecem uma aproximação suficiente para esta finalidade.
     De acordo com essas regras, a Páscoa nunca acontece antes de 22 de março nem depois de 25 de abril. A quarta-feira de cinzas ocorre 46 dias antes da Páscoa (período da quaresma).
     Ora, neste ano o equinócio aconteceu em 20 de março, às 23:21 UTC (20:21 em Brasília); e como a lua cheia tinha ocorrido na véspera, foi preciso esperar mais 29 dias pela próxima. E esta veio na última segunda-feira, causando uma espera extra de seis dias...
     A data da Páscoa (até 2022) é:
     2011 Abril  24   -   2012 Abril 8   -   2013 Março 31
     2014 Abril 20   -   2015 Abril 5   -   2016 Março 27
     2017 Abril  16   -   2018 Abril  1   -   2019 Abril 21
     2020 Abril 12   -   2021 Abril 4   -   2022 Abril 17
     As igrejas ortodoxas usam para a data da Páscoa o calendário juliano e não o gregoriano. Em toda a cristandade, as festividades começam na quinta-feira anterior (quinta-feira santa), prosseguem pela sexta-feira da paixão, continuam no sábado de aleluia e culminam no domingo de Páscoa.
     Na quinta-feira santa, dia de endoenças (indulgências), a Igreja celebra a instituição da Eucaristia, relembrando a última ceia de Cristo com seus apóstolos (que foi uma celebração do "sêder de Pessach"). Os bispos consagram o óleo de oliva misturado com perfume (bálsamo) que será usado nas ocasiões de Batismo, Crisma e Unção dos Enfermos. A cerimônia do lava-pés - que rememora o gesto humilde de Cristo purificando os pés de seus seguidores - é muito difundida no Brasil.
     Na sexta-feira santa, ou Sexta-Feira da Paixão, relembra-se a traição do Iscariotes, a prece de Jesus no Jardim de Getsêmani, sua prisão, julgamento, suplício e cruel execução. Fica claro, nos evangelhos, que Jesus foi vítima de um julgamento romano, por magistrados romanos, segundo a lei romana e sofreu execução romana; o Sinédrio judeu poderia tê-lo condenado à morte por lapidação (apedrejamento), mas nunca por crucificação.
     O Sábado de Aleluia é o último dia do tríduo pascal, e é um dia de expectativa e vigília. É também o dia em que uma antiga, curiosa e controvertida manifestação popular acontece: a "malhação do Judas".
     Finalmente, o Domingo da Ressurreição é festejado como a celebração máxima do cristianismo. É a vitória da Vida sobre a Morte, do Bem sobre o Mal.
     Os costumes variam de país para país. Além dos instituídos pela Igreja (dias de guarda, de jejum e de abstinência), incluem tradições locais ou "importadas", quase todas com origem em festividades pagãs relacionadas à comemorações do Equinócio (início da primavera, no hemisfério Norte), principalmente as de origem germânica. O coelho, símbolo de fertilidade, e o ovo, significando a renovação da vida, são os mais conhecidos. O almoço festivo do Domingo também não pode faltar.
     Boa Páscoa, amigos... a todos nós.

12 comentários:

  1. Barcellos....

    Eu sabia que podia contar com tua astúcia..!!! tchân,,,
    É quêu fazi uma postagem pra Páscoa e arrezôrvi fazer de modo descontraído sem a importância do real significado... ( assim bem comercial meRmo )

    Sabe pusquê? Pusqu~e sabia que tu faria a melhor das postagens do gênero ... hehehehe
    Yéhhhhhh... ACERTEI

    Aguarde a minha então....
    Abraços buxo véi danado.... kkkkkkk
    Tatto
    FELIZ PÁSCOA

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  2. Rodolfo

    o que é o bem? e o que é o mal???

    Feliz Pascoa...feliz ressureição


    beijocas

    Loisane

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  3. É importante notar que Pessach significa a passagem, porém a passagem do anjo da morte, e não a passagem dos hebreus pelo Mar Vermelho ou outra passagem qualquer, como alguns querem entender. Abraços e obrigado pela ótima aula.

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  4. Meu querido, sua aula foi incrível. Só faltou ter fotografado a lua de ontem, celebrando o início da Páscoa judaica, mas a imagem do Obelix carregando o ovo da Páscoa ficou massa.

    Esse seu texto tão bem construído dá até um encabulamento em postar tolices, viu? Devo pensar e repensar.

    Feliz Páscoa, querido bruxo, senhor das letras.
    Beijos.
    Beijos.

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  5. Que aula, que sabedoria, que orgulho.

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  6. Belo e esclarecedor texto!
    Mas, quanto ao julgamento e execução de J. Cristo pelos romanos, é preciso notar que a região estava sob ocupação militar de Roma, e que os romanos reservaram para si o direito de serem os únicos a aplicar a pena capital, apesar de permtirem outras ações e punições por parte das lideranças judaicas, para dar uma ilusão de autonomia e evitar revoltas. Como os dirigentes (sacerdotes) judeus queriam executar JC, e isto só podia ser feito pelos romanos, pressionaram o governador Pilatos a julga-lo e executa-lo, muito a contragosto, pois os romanos não tinham nada contra JC e a esposa do próprio governador ser uma admiradora dos sermões de JC, que costumava assistir. Os únicos que se consideravam ameaçados pelas parábolas eram os sacerdotes, que governavam através da fé religiosa do povo.
    Entre os evangelhos apócrifos, retirados pela igreja católica da Bíblia, existem cartas de Pilatos, relatando ter sofrido pressão e cedido, para evitar uma revolta dirigida pelos sacerdotes.
    Mas, não vejo nisto motivo para ninguém odiar os judeus. Afinal, acho que todas as religiões em algum tempo cometeram barbaridades,como a católica, com a sua Inquisição!
    Abraços!

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  7. São tantos os significados que dão a pascoa que esquecem de Jesus,,,o principal personagem dela...grande abraço de bom dia pra ti amigo,,,obrigado sempre pela presença e pelas palavras..abraços fraternos...

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  8. Excelente texto!
    Muito , muito esclarecedor!
    Aprendi com você.
    Muito grata, amigo.
    Feliz Páscoa!
    Abraço.

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  9. Querido amigo, Páscoa é amor, ressurreição e renovação, abra seu coração e deixe que o amor faça sua eterna moradia. Tenha uma Feliz e abençoada
    Páscoa.
    Beijocas de chocolate.

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  10. - Tatto, grato pelo elogio... e parabéns pela sua postagem.
    - Lois, suas perguntas merecem um tratado filosófico em resposta... mas lá vai:
    "Bem" é tudo o que te traz felicidade, sem causar infelicidade a outrem;
    "Mal" é tudo o que te deixa infeliz.
    - Jair e Leonel, nem sempre a "verdade" histórica corresponde à "verdade" do espírito. Assunto para outro tratado. Estou preparando algo a respeito.
    - Milene, Rafa, Everson, Zélia, Marilu... grato pela visita e opiniões.

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  11. Magnifica postagem, Barcellos !

    Independente de acreditar , gostar ou não . sempre é interessante conhecer a história.

    Saio daqui sabendo um pouco mais sobre essa data.

    Um abraço ao amigo , que tem como prática a gentileza.

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