segunda-feira, 15 de março de 2010

Genética I

   A pesquisa genética é antiquíssima, mas só obteve status de ciência com Gregor Mendel, que abordou em 1856 o estudo da herança genética a partir dos seguintes pressupostos, geralmente aceitos na época:

   a) O cruzamento de duas linhagens geneticamente puras deveria produzir híbridos com características de ambas as linhagens;
   b) O entrecruzamento desses híbridos deveria produzir uma progênie também híbrida.
   Mendel resolveu tirar a limpo essas idéias, com experimentos práticos.
   Para garantir a pureza das linhagens iniciais, ele escolheu duas variedades de ervilhas - uma de semente amarela, outra de semente verde. Essas variedades têm flores hermafroditas e se reproduzem por autofecundação, o que garante sua pureza. Também têm um ciclo reprodutivo rápido e produzem um número elevado de sementes, o que facilitava o prosseguimento das pesquisas.
   O primeiro problema era cruzar dois indivíduos que normalmente se reproduzem por autofecundação. Mendel emasculou as flores de um exemplar, amputando-lhe as anteras quando ainda imaturas e polinizando-as, após a maturidade, com o pólen da outra variedade - uma inseminação artificial. Depois, observou e anotou as características das sementes produzidas e plantou-as, deixando que as gerações seguintes se reproduzissem normalmente.
   Os primeiros resultados foram frustrantes, mas Mendel era teimoso e paciente, e após sete anos e 19.000 cruzamentos pôde enunciar as leis que fundamentam a genética moderna.
  A experiência de Mendel foi repetida e aperfeiçoada por inúmeros pesquisadores - usando outros vegetais, moscas (a famosa drosófila), ratos etc. Como não tenho espaço para cultivar vegetais e não gosto de moscas ou ratos, resolvi usar como cobaia um simpático besourinho da espécie Polychroma Rodrigensis. É um coleóptero virtual, sugerido por meu amigo Leonel, o que facilita muito as coisas. Vamos ilustrar com ele a experiência de Mendel:
   Como dissemos, Mendel achou intrigante o resultado, pois a partir da segunda geração obtinha sempre 3/4 de sementes amarelas e 1/4 de sementes verdes. Mas acabou deduzindo corretamente as causas dessa distribuição aparentemente sem sentido das cores.
   Segundo ele, cada indivíduo carrega consigo dois conjuntos de fatores, emparelhados entre si. Um conjunto provém do pai e o outro é herdado da mãe. Cada par de fatores do conjunto determina uma característica. A cor, por exemplo, é determinada por um par de fatores - um paterno e outro materno. Quando há conflito entre eles, um dos dois prevalecerá. No caso da cor da semente, o amarelo sempre dominará - seja ele de origem paterna ou materna.

   Como os P. Rodrigensis patriarcas são de raças puras, mas diferentes, é evidente que toda a sua prole será híbrida - com um gene de cada cor na sua bagagem genética - e nesse caso o amarelo assume o comando: é o gene dominante. O verde, chamado recessivo, não se manifesta, mas continua apto a ser transmitido na reprodução. É lógico que todos os insetos da primeira geração serão amarelos, apesar de serem todos híbridos.
   Cada um desses híbridos transmitirá um único gene - amarelo ou verde - à sua prole, e o resultado do entrecruzamento é mostrado na ilustração. É possível (mas improvável) que um casal isolado de híbridos produza só descendentes de raça pura, ou só híbridos, mas estamos tratando de cruzamentos múltiplos, com descendência numerosa. A distribuição mais provável, comprovada estatisticamente na prática, é de que metade dos descendentes serão híbridos (amarelos), 1/4 amarelos puros e 1/4 verdes puros.
   Observe que uma característica dominante não é necessariamente vantajosa. Segundo o Leonel, os P. Rodrigensis usam seu mimetismo natural como defesa contra predadores, e num ambiente verde os indivíduos verdes têm mais chances de sobreviver e procriar. Aos besourinhos amarelos resta o duvidoso consolo de serem um item importante na cadeia alimentar dos pássaros insetívoros, exatamente por serem em maior número... e amarelos.

   Nas próximas partes:
   a) Cromossomos, mitose e meiose.
   b) Reprodução sexuada e assexuada.
   c) Mutação: O surgimento do Polychroma Rodrigensis da variedade branca.
   d) O gene assassino.

3 comentários:

  1. Gostei do didatismo desse ABC da genética, especialmente do uso do Polychroma Rodrigensis, coleóptero descoberto e descrito pelo nosso amigo Leonel. O Leonel também já foi alvo de minha homenagem no texto "Inventando Soluções". Abraços, JAIR

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  2. Agradeço a homenagem do mestre Barcellos, substituindo as chatas mosquinhas-da-banana (Drosófilas)de olhos brancos ou vermelhos, pelo simpático Polychroma Rodrigensis, de cores tão nacionalistas.
    Eu me lembro que, durante esta aula, no primeiro ano do curso científico, eu desenhei no meu caderno uma reprodução da gravura do nosso sisudo padre Gregório Mendel que havia no livro. E sem perder o assunto da aula!
    Bons tempos!

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  3. Caros amigos Leonel e Jair, quando eu abordo um tema técnico ou científico, procuro sempre provocar a curiosidade de jovens leigos, na esperança de despertar talvez uma vocação promissora. Assim, uso um estilo leve e coloquial, na medida em que minhas limitações literárias permitem. Alguns assuntos mais complexos se tornam um verdadeiro desafio, e é sempre gratificante receber o apoio de amigos que carregam uma bagagem tão rica. Obrigado.

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