terça-feira, 5 de janeiro de 2010

A filha da Magia

CIÊNCIA E MAGIA

   Este artigo expressa minha visão pessoal sobre a evolução da ciência. Não me preocupei em pesquisar fontes ou documentar assertivas. Dentro dessas limitações, procurei ser o mais coerente possível.


   Niterói, 5 de janeiro de 2010.

   R R Barcellos


   Quando os primeiros hominídeos começaram sua longa caminhada rumo ao estabelecimento das primeiras civilizações conhecidas, tiveram eventualmente que abandonar o nomadismo em favor de um relacionamento mais direto com o solo. A coleta de frutos e raízes, assim como a caça e a pesca, deram lugar, gradualmente, à produção agrícola e pastoril. Assim, o homem se fixou ao solo, e teve que aprender, a duras penas, como tratar a mãe terra para obter dela tudo o que precisava. E logo descobriu que a mãe terra precisava de muita água.


   Não foi por acaso que as primeiras grandes civilizações nasceram às margens de grandes rios. A bacia mesopotâmica e o vale do Nilo conheceram, quase ao mesmo tempo, duas das maiores civilizações do mundo antigo. Em outras partes do planeta acontecia a mesma coisa, mas vamos nos limitar aqui às origens de nossa civilização ocidental.


   Com a fixação ao solo, o poder dos grupos dominantes encontrou um novo alicerce: a propriedade agropastoril. Foi necessário, então, criar instrumentos capazes de quantificar o valor da terra. A sequência provavelmente foi:


1- Desenvolvimento da escrita até o nível de representação de quantidades numéricas, entre outras aplicações, e adoção de uma base numérica. É provável que a base 5 ou 10 tenha sido escolhida, pelo hábito já arraigado de contar pelos dedos das mãos.


2- Padronização e cálculo de distâncias lineares;


3- Cálculo de áreas, começando pelas formas retangulares e evoluindo para a área dos triângulos. (Qualquer triângulo pode ser decomposto em dois triângulos retângulos, cuja área é facilmente calculável, sem necessidade nem mesmo de Pitágoras.)


   Com esses instrumentos, qualquer área delimitada por linhas retas podia ter seu valor precisamente calculado, e assim nasceu o primeiro IPTU.


   Mas o próximo desafio era o cálculo do calendário. A riqueza dos proprietários (e portanto sua capacidade de pagar o IPTU) dependia do rendimento das plantações, que sofria a influência das épocas de cheias e de vazantes, do clima e da temperatura e do tempo de insolação diária, variável ao longo das estações.


   A essa altura, os homens que se dedicavam aos cálculos já haviam adquirido o respeito do povo e da elite dominante, à qual muitos deles pertenciam, e haviam constituído um núcleo corporativista de “magos”, que atacou o novo desafio.


   A duração do ano, em dias, foi calculada em algumas décadas de observação; mas havia um problema: como dividir um círculo em 365 partes iguais, e mais uma fração ainda não bem determinada? É matematicamente impossível dividir um ângulo qualquer em três partes iguais, só com régua e compasso. Mas eles não sabiam disso e devem ter feito muitas tentativas frustradas até se convencerem dessa impossibilidade.


   Por fim, optaram pela única solução prática a seu alcance: dividiram o círculo em doze partes iguais (coisa fácil com qualquer compasso); cada arco dessa divisão foi retificado pela sua corda, e esta dividida linearmente em trinta partes iguais. Estavam criados os doze meses do ano e o círculo de 360 graus. Os cinco dias restantes eram acrescentados ao fim de cada ano, com correções eventuais quando necessárias (prelúdio dos anos bissextos).


   Desses magos antigos todos nós herdamos nossos métodos modernos de calcular o tempo (anos, meses, dias, horas, minutos e segundos) e de medir os ângulos (graus, minutos e segundos). Muitas unidades de medida correntes no nosso dia-a-dia também vieram daí. Pense nisso quando for comprar uma dúzia de ovos...


   Concomitantemente aos avanços na geometria, a medicina e a filosofia também conquistaram novos horizontes. O Velho Testamento traz indicações sobre sintomas de doenças e o Código de Hamurabi assume para o Estado o papel de legislador, juiz e executor.


  Mas as civilizações se multiplicavam, os conhecimentos evoluíam e os antigos magos foram se adaptando lentamente aos novos ares. Na Grécia antiga, Hipócrates aperfeiçoava a medicina e um outro homem estudava pela primeira vez as características do próprio conhecimento científico. Sócrates exclamou: “Só sei que nada sei!” - mesmo sabendo que sabia mais que os sábios da época. Começava ali a autocrítica da ciência.


   Nessa época, germinaram as sementes da ciência moderna – e não só na Grécia. Mas por muito tempo o joio e o trigo disputaram a mesma seara. Na Idade Média, prevaleceu na Europa o joio, enquanto o trigo encontrava solo fértil na cultura árabe. No renascimento, as duas correntes chegaram ao paroxismo da luta, com a Inquisição – sentindo a derrota iminente – condenando Galileu e Giordano Bruno: um à retratação e o outro à fogueira.


   A partir de então, os métodos de investigação científica vem se aperfeiçoando constantemente; mas alguns expoentes dessa investigação se esquecem às vezes do princípio de autocrítica que ela exige, e exageram o valor de suas próprias descobertas.


   Nos dias que correm, percebe-se cada vez mais que cada porta aberta conduz a muitas outras, e que o limiar do conhecimento não é uma fronteira fixa, mas um horizonte que se afasta um passo para cada passo que se dá em direção a ele. É como a assíntota de uma curva... quanto mais pesquisamos, mais chegamos perto, mas nunca a alcançaremos. Mas vamos continuar avançando. Há tesouros insuspeitados ao longo da parte inexplorada da curva.


   Quanto aos magos modernos e contemporâneos, eu os divido em categorias:


1- Os cientistas – Galileu, Copérnico, Newton, Einstein. Stephen Hawking. César Lattes. Diversos ganhadores do Nobel. Aqui se situam os astrônomos, matemáticos, astrofísicos, médicos, filósofos, economistas etc. Sobra lugar para todos os cientistas formais.


2- Os iluminados – Nostradamus, Edgard Cayce, Zé Arigó. Mohandas Ghandi. Outros do mesmo calibre.


3- Os guardiões – Jostein Gaard. Paulo Coelho (com restrições. É difícil para mim entender sua participação na mídia contracenando com um automóvel). De qualquer modo, coloco nesta categoria aqueles autores sérios que se dedicam a esclarecer aos leigos os aspectos menos conhecidos da antiga magia. Talvez haja lugar aqui para J R R Tolkien, entre outros...


4- Os charlatões – Todas as madames Zuleikas e astrólogos de fancaria, quiromantes e cartomantes que pululam por aí… com pouquíssimas exceções.



   Nota: este artigo estava perdido nos meandros da minha memória e nos arquivos de meu computador. Resgatei-o de lá após ler no blog de meu amigo Jair uma excelente matéria sobre tema semelhante.



Um comentário:

  1. O meu texto sobre ciência já se justifica por ter dado azo ao seu. Gostei do histórico das ciências e das celebridades listadas, só não concordo com o Paulo Coelho como "guardião", para mim ele estaria na lista dos charlatões. Contudo, respeito sua opinião, até porque você é meu alter ego, como já escrevi anteriormente.

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