quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Vendo votos

- Vendo, seja do verbo ver, vender ou vendar. Entenda como quiser. Pois vendo tantos votos vendados e vendidos, resolvi entrar nessa maracutaia.
- Mas não vendo para qualquer um. Estabeleci como público-alvo meus filhos e netos. Entendo que um voto é (ou deveria ser) uma semente de esperança para um futuro melhor, e eles tem mais futuro do que eu.
- Ademais, eles já me pagaram adiantadamente. Não só com sorrisos e abraços (como faz qualquer político no palanque), mas também dando-me licença para dar pitacos e sugestões na formação de seus valores éticos e culturais (como nenhum político faz). Portanto, meus votos vão para quem eles indicarem.
- Imponho, porém, como condição básica, o comprometimento sério do candidato e seu partido no aspecto mais fundamental e mais vilipendiado de nossas instituições: a educação.
- Não falo daquela educação eleitoreira, que se traduz em bolsas-esmola, mas de uma educação programática (não confundir com pragmática), supra-partidária, que integre formação de valores éticos, instrução acadêmica, informação cultural, cidadania (não só direitos, mas também deveres)...
- Pois creio que qualquer avanço sólido nas outras áreas - Saúde, Habitação, Segurança etc, depende necessariamente de uma formação de qualidade dos seus profissionais. E esta se inicia nas creches e jardins e prossegue pelo menos até à universidade. Sim, todos os brasileiros deveriam ter acesso ao ensino superior... e não adianta garantir esse direito por lei, se lhes negamos o instrumento básico para isso: uma educação de alto nível.
- A erradicação do analfabetismo deve incluir, sim, o analfabetismo funcional e o analfabetismo secundário. Mas o que é um "analfabeto secundário"?
- Vejamos a definição de J. R. Teixeira Coelho:
- "Indivíduo alfabetizado, com grau de informação que pode variar do mais baixo ao mais especializado, (...) familiarizado com as condições de existência num grande centro urbano, mas desprovido de uma visão cultural mais ampla de sua própria vida e do contexto social. (...) Caracteriza-se por ter sua atenção desviada por trivialidades (os pseudo-eventos criados pela televisão, novelas, competições esportivas etc), (...) orientar-se por uma sucessão de entretenimentos vazios e receber informações políticas sob a forma de comunicação espetacularizada." 

- Teixeira Coelho nos dá uma visão mais completa em

http://www.usc.br/edusc/noticias/saopaulo2.htm
 

de onde extraí o trecho abaixo:
- Em Homo Videns, Giovanni Sartori faz um ataque demolidor, embora parcial, contra a TV:
- A TV aberta virou predominantemente uma grande latrina enquanto a TV a cabo é apenas um pouco menos ruim. Portanto, falar em idiotia talvez seja mesmo correto. Hans Magnus Enzensberger usou um outro eufemismo para designar o homem pós-TV:  analfabeto secundário. É a pessoa que consegue ler um jornal, sacar dinheiro de um caixa eletrônico, mas é incapaz de interpretar por si o cenário político ou cultural que o cerca. Analfabeto secundário é, hoje, uma forma polida demais. Idiota parece ser o termo. Que o público se enterneça com o idiota Forrest Gump é o sinal mais claro não apenas da existência da idiotia, mas também de seu culto. Idiotia que se desdobra, por exemplo, na recepção triunfal dada em sua cidade àquele mesmo senador renunciante. Mas, como sempre, é bom ir devagar com o andor. Talvez todos tenhamos direito a um índice cotidiano de idiotia. Talvez a idiotia da TV não produza necessariamente o idiota perfeito. Que a TV abre as portas para nosso idiota interior, aquele de cada um de nós, é evidente. Que sucumbamos todos, inclusive as massas, sempre e em todos os aspectos a esse "idiota residente" não é tão certo.
- Teixeira Coelho continua:
- "Fora isso, o livro repete idéias conhecidas. De certo, resta que não mais se trata apenas de constatar a idiotia promovida pela mídia eletrônica e alertar para o assalto à democracia e ao pensamento feito pelos gangsta rap e outros neonazistas mal disfarçados. Se há um tema a discutir é o de uma política cultural para a mídia eletrônica, TV e internet. Elas estão aí; como usá-las para evitar que nos usem: é essa a questão, ainda evitada na sociedade e nos governos". 


- Vendo votos para bons candidatos. O mais difícil é escolher aqueles que não sejam analfabetos secundários...

3 comentários:

  1. Parabéns Barcellos, num universo de idiotas televisivos e até internetizados, há necessidade que alguma voz se levante contra a mediocridade, esta é sua voz. Obrigado por lançar esse libelo corrosivo e inteligente contra nosso analfabetismo crônico e que está formando uma geração cega que deverá herdar este nosso Patropi.

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  2. Ótima e oportuna lembrança, Barcellos!
    Me parece que infelizmente, tem muita gente desavisada caindo no "ôba-ôba" das TVs, ao invés de tirar suas próprias conclusões!
    Às vezes, vejo pessoas ficarem surpresas quando eu externo uma opinião bem diferente da que alguns querem vender como "unanimidade"! Dizem que o brasileiro tem "memória fraca", mas parece que, como no livro 1984, de George Orwell, tem gente fabricando a verdade que lhe convém, apagando e reescrevendo o passado para dominar o presente e o futuro.
    Abraços!

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  3. Bom, li e reli seu comentário no meu post e ainda não sei se era mesmo pra mim aquilo tudo. Nossa! Fiquei muito lisonjeada, obrigada!

    Há de fato um analfabetismo gritante, como se entranhado na sociedade. Estes analfabetos secundários, certamente acham mais conveniente permanecer assim, alheio, sem se envolver em questões que impliquem pensar e tomar atitude por si próprio.

    Assim, a passos lentos, sem se permitir muito esforço intelectual, segue a caminhar o analfabetismo secundário.

    Moço, mais uma vez agradeço suas generosas palavras. Sinto-me honrada com sua presença lá.

    Beijos.

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